Modicidade tarifária e segurança operativa: o novo ciclo da Itaipu

André Pepitone*

Itaipu Binacional ocupa posição singular no setor elétrico sul-americano. Não é brasileira nem paraguaia: é do Brasil e do Paraguai. Essa natureza binacional, que exige decisões por consenso, moldou uma cultura institucional pautada pelo diálogo, equilíbrio e cooperação. A usina é, portanto, um símbolo concreto de integração entre povos e de compromisso compartilhado com o desenvolvimento sustentável e a segurança energética da região.

O ano de 2023 marcou virada histórica para Itaipu. Com a quitação integral da dívida de construção, em 28 de fevereiro, a usina entrou em nova fase de operação e gestão. O impacto foi imediato: a tarifa de repasse para os consumidores brasileiros, que até 2022 se mantinha em média de US$ 27,86/kW.mês, caiu 27,4% em 2023, passando a ser naquele ano US$ 20,23/kW.mês. Para o triênio 2024–2026, a tarifa foi estabelecida em US$ 17,66/kW.mês, representando redução de 36,6%.

Essas sucessivas quedas consolidaram a hidrelétrica de Itaipu como uma das fontes de energia mais competitivas do portfólio do mercado regulado brasileiro, contribuindo diretamente para a modicidade tarifária de milhões de famílias e para a previsibilidade de custos das distribuidoras. A competitividade é expressiva: em 2025, o custo médio da energia de Itaipu no reajuste tarifário da distribuidora CPFL Piratininga, localizada no estado de São Paulo, foi de R$ 221,30/MWh, valor inferior ao das usinas cotistas da Lei 12.783/2013 (R$ 222,59/MWh) e bem abaixo do preço médio de aquisição de energia pelas distribuidoras em 2025 –  ACRmédio (R$ 307,29/MWh). Para 2026, o valor projetado do ACRmédio pela ANEEL (Agência Nacional de Energia Elétrica) é de R$ 342,71/MWh, ampliando ainda mais a diferença.

Ao se comparar Itaipu com os preços médios dos contratos de leilões de energia firmados nos últimos dez anos pela CCEE (Câmara de Comercialização de Energia Elétrica), o desempenho é igualmente notável: a tarifa da usina situa-se como a segunda mais competitiva do conjunto. A tarifa supera apenas a média do LEE (Leilão de Energia Existente), em que os contratos firmados são de curto prazo. Registra-se que a política tarifária de Itaipu, resultado de sua condição binacional e da disciplina financeira de sua gestão, leva a um valor de energia praticado em 2025 de 33,5% inferior à média dos contratos dos leilões da CCEE (R$ 362,2/MWh), traduz-se em benefícios concretos à economia dos dois países.

Ao contrário da maioria das hidrelétricas que integram o MRE (Mecanismo de Realocação de Energia), Itaipu apresenta superávit de geração, atuando como doadora no mecanismo. Isso significa que, além de produzir acima da média, a usina contribui para reduzir o custo do bloco hidráulico nos últimos anos, reforçando a estabilidade financeira e operativa do sistema.

O papel de Itaipu no setor elétrico também evoluiu. Se no passado a usina representava sobretudo a relevância energética — pela magnitude de sua geração e sua contribuição à oferta nacional —, hoje seu papel central está associado à segurança operativa do SIN (Sistema Interligado Nacional).

A transformação da matriz elétrica brasileira – marcada pela expansão acelerada das fontes eólica e solar, especialmente nas regiões Nordeste e Norte – redefiniu a função de Itaipu. A usina passou de grande fornecedora de energia para pilar de estabilidade operativa do SIN. Seu perfil técnico permite compensar, em tempo real, as oscilações dessas fontes intermitentes, contribuindo para a confiabilidade do suprimento elétrico nacional.

O fenômeno conhecido como “curva do pato”, decorrente da queda da geração solar ao entardecer combinada com o aumento do consumo no mesmo horário, exige fontes com resposta rápida e previsível. É exatamente nesse momento que Itaipu desempenha papel essencial: entregando potência na ponta e respondendo com agilidade às rampas de demanda, estabilizando o sistema quando o sol se põe e a carga cresce.

Essa capacidade operacional é resultado de um parque gerador robusto, aliado a uma gestão binacional eficiente e a uma coordenação integrada com o ONS (Operador Nacional do Sistema Elétrico). Em momentos de estresse hidrológico ou de volatilidade da geração renovável, Itaipu se mantém como um ativo de segurança sistêmica – um seguro energético em favor da estabilidade nacional.

Sua localização também é estratégica. A geração de Itaipu ocorre no submercado Sudeste, região que concentra o maior consumo elétrico do país. Com isso, a energia é entregue exatamente onde é mais necessária, reduzindo perdas de transmissão e aumentando a eficiência global do sistema.

Mais do que um empreendimento de geração, Itaipu é um projeto de Estado, construído sobre a premissa de que integração regional e segurança energética caminham juntas. A quitação da dívida em 2023 inaugurou um novo ciclo de competitividade e benefício social: a redução expressiva de sua tarifa permitiu que Itaipu se tornasse uma das fontes de energia mais econômicas do mercado regulado do país, contribuindo diretamente para a modicidade tarifária e refletindo-se nas contas de milhões de famílias brasileiras. 

Cada megawatt-hora produzido pela usina não apenas reforça a confiabilidade do sistema elétrico, mas também alivia o custo da energia para consumidores. Em um momento em que o preço da energia é fator decisivo para o poder de compra, a competitividade de Itaipu é entrega concreta de valor público, resultado de gestão eficiente e de parceria binacional que traduz, em números, os benefícios do consenso e da cooperação.

*André Pepitone é diretor financeiro executivo da Itaipu Binacional e ex-diretor-geral da ANEEL.

As opiniões dos autores não refletem necessariamente o pensamento da Agência iNFRA, sendo de total responsabilidade do autor as informações, juízos de valor e conceitos descritos no texto.

Foto da thumb: Itaipu Binacional

Fonte:https://agenciainfra.com/blog/modicidade-tarifaria-e-seguranca-operativa-o-novo-ciclo-da-itaipu